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[61] Tríptico aleatório de Trilussa

30.11.04
I. Er Somaro e el Leone
Un Somaro diceva: - Anticamente,
quanno nun c’era la democrazzia,
la classe nostra nun valeva gnente.
Mi’nonno, infatti, per avé raggione
Se coprì co’la pelle d’un Leone
e fu trattato rispettosamente.

So’ cambiati li tempi, amico caro:
- fece el Leone – ormai la pelle mia
nun serve più nemmeno da riparo.
Oggi, purtroppo, ho perso l’infruenza,
e ogni tanto so’ io che pe’ prudenza
me copro co’ la pelle de somaro!

(1 de Maio de 1915)

II. Suffraggio universale
Un’Aquila diceva: - Dar momento
che adesso c’è er suffraggio universale,
bisognerà che pure l’animale
ciabbia un rappresentante ar Parlamento;
dato l’allargamento, o prima o poi,
dopo le donne lo daranno a noi.

Ma allora chi faremo deputato?
Quale sarà la bestia indipennente
Che rappresenti più direttamente
La classe animalesca de lo Stato?
e a l’occasione esterni er su’ pensiero
senza leccà le zampe ar Ministero?

Per conto mio, la sola che sia degna
de bazzicà la Cammera e conosca
l’idee de l’onorevoli è la Mosca,
perchè vola, s’intrufola, s’ingegna,
e in fatti de partiti, sia chi sia,
passa sopra a qualunque porcheria!
(1 de Janeiro de 1914)

III. All’ombra
Mentre me leggo er solito giornale
spaparacchiato all’ombra d’un pajaro,
vedo un porco e je dico: - Addio, majale! –
vedo un ciuccio e je dico: - Addio, somaro!

Forse ‘ste bestie nun me capiranno,
ma provo armeno la soddisfazzione
de potè di’ le cose come stanno
senza paura de finì in priggione.

(1932)

[60] POBRE PÁTRIA!

Povera patria!
Schiacciata dagli abusi del potere
di gente infame, che non sa cos'è il pudore,
si credono potenti e gli va bene quello che fanno;
e tutto gli appartiene.

Tra i governanti, quanti perfetti e inutili buffoni!
Questo paese è devastato dal dolore...
ma non vi danno un po' di dispiacere
quei corpi in terra senza più calore?

Non cambierà, non cambierà
no cambierà, forse cambierà.

Ma come scusare le iene negli stadi e quelle dei giornali?
Nel fango affonda lo stivale dei maiali.
Me ne vergogno un poco, e mi fa male
vedere un uomo come un animale.

Non cambierà, non cambierà
sì che cambierà, vedrai che cambierà.

Voglio sperare che il mondo torni a quote più normali
che possa contemplare il cielo e i fiori,
che non si parli più di dittature
se avremo ancora un po' da vivere...
La primavera intanto tarda ad arrivare.
(Franco Battiato)

[59] Aos políticos de todos os quadrantes



Afinal, que merda é que andam a fazer?


[58] Dedicado aos nossos intelectuais

Pappagallo ermetico

Un Pappagallo recitava Dante:
«Pape Satan, pape Satan aleppe...».
Ammalappena un critico lo seppe
corse a sentillo e disse: - È impressionante!
Oggiggiorno, chi esprime er su'pensiero
senza spiegasse bene, è un genio vero:
un genio ch'è rimasto per modestia
nascosto ner cervello d'una bestia.

Se vôi l'ammirazzione de l'amichi
nun faje capì mai quelo che dichi.


(Trilussa, 1937)

[57] U2 e os Joy Division

28.11.04

Vertigo, a primeira música do novo How to Dismantle an Atomic Bomb, tem um riff do baixo que muito faz lembrar Isolation, do álbum Closer dos Joy Division. Claro que a sofisticação é outra, mas as notas estão lá. Ora ouça-se.

[56] Rapidinhas sobre o eixo do mal

Inspirarem-se em Marcelo Rebelo Sousa, com ironia, não é propriamente um ponto forte. Tanto mais que é a estratégia utilizada pelo Barnabé Rebelo De Sousa. Será por encarnar a predominância do Daniel Oliveira?

No programa desta madrugada, Clara Ferreira Alves, enquanto defendia com convicção a inocência de Carlos Cruz, zangou-se com alguns jornalistas, que tiveram e continuam a ter «comportamentos delinquentes» em relação aos arguidos do caso Casa Pia. Disse palavras certas e, em larga medida, até, óbvias na indignação. Esqueceu-se, porém, que nenhuma justiça se baseia em convicções. Só a da turba exaltada.

Os cinco protagonistas, não obstante a argúcia das intervenções, parecem peixinhos vermelhos num aquário: nunca se tocam, não polemizam entre si, não discordam. Estão nos antípodas do A quadratura do círculo e de quanto diz G. Steiner:
«Sou um espírito dialéctico e, sob muitos aspectos, hegeliano [...]; há na reconciliação [...] um nada da sombra de um certo tédio» (A. Spire e G. Steiner (2003). Barbárie da Ignorância, Lisboa. Fim de Século, 81).
Esperemos pelos próximos episódios.

Daniel é o dominador; Mexia, o ponderado; Júdice, o arguto, apesar das dificuldades na fluência discursiva; Clara, aquela que mais põe as emoções ao serviço das suas ideias (ambas excelentes, de resto); o apresentador limita-se a gerir as intervenções e as imagens e melhorou muito do primeiro para o último programa (menos ansioso e abrupto na mudança de temas).

A não perder.

[55] Efeitos colaterais

A blogosfera ficou marcada esta semana pela polémica despoletada pelas reacções de alguns bloggers d’ O Acidental (J.B. Ribeiro e V. Rato) a um artigo de Pedro Mexia no DN. Ficará para a história, ou não, como «a questão Pedro Mexia», nas palavras do Aviz . A este respeito, pronunciaram-se: - O Almocreve das petas , em [Confessionário] e Filho-da-Puta & Outros ; o
Bloguítica , em [2202] CRIME DE OPINIÃO? (I) e [2208] CRIME DE OPINIÃO?(II).

Os Acidentais já referidos não deixaram os seus créditos por mãos alheias e responderam à letra a estes últimos: o Almocreve das Petas seria um autêntico FdP e o Paulo Gorjão do Bloguítica, um simples desconhecido.
Enfim, efeitos colaterais de uma guerra blogosférica cada vez mais acidentalmente unilateral.

[54] Quatro coisas importantes

27.11.04
Um dos livros que li, de um fôlego, em Agosto passado – depois de uma estadia estimulante em Alfafar (voltarei ao tema mais adiante) – foi Barbárie da ignorância, da Fim de Século, numa tradução (boa) de Miguel Serras Pereira. O livro mais não é que a transcrição de programas de rádio difundidos pela France Culture. Protagonistas: Antoine Spire (jornalista e director, durante vinte e quatro anos do programa radiofónico Staccato)), no papel de entrevistador, e George Steiner (docente universitário, filósofo da linguagem e da tradução, crítico literário e ficcionista), no de entrevistado. A certa altura, Steiner diz:

No tempo de Brejnev – já não era o pior; era ainda gravíssimo, mas já não era o regime de Estaline -, havia uma jovem mulher russa numa universidade, especialista em literatura romântica inglesa. Essa mulher jovem foi metida numa cela, sem luz, sem papel nem lápis, na sequência de uma delação idiota e completamente falsa, não é preciso dizê-lo. Sabia de cor o Don Juan de Byron (trinta mil versos, ou mais). No escuro, põe-se a traduzi-lo mentalmente em rimas russas. Quando sai, depois de ter perdido a vista, dita a tradução a uma amiga: é hoje a maior tradução russa de Byron.
Perante isto, digo a mim mesmo várias coisas, e, para começar, que o espírito humano é indestrutível, totalmente. Em segundo lugar, que a poesia pode salvar o homem. Até mesmo no impossível. Em terceiro lugar, que uma tradução, apesar da sua imperfeição humana, traduz aquilo que traduz, o que é uma outra maneira de dizer que a linguagem e a realidade mantêm uma relação que as liga. E, em quarto lugar, digo-me que devemos sentir uma grande alegria.

[53] DOS RIOS (X ): emily dickinson

My River runs to thee --
Blue Sea! Wilt welcome me?
My River wait reply --
Oh Sea -- look graciously --
I'll fetch thee Brooks
From spotted nooks --
Say -- Sea -- Take Me!



[52] DOS RIOS (IX): michele Connelly

In winter, everything's yellow
but the willows. The grass goes
gold and the weeds brittle into
smooth yellow stalks; even the river
seems golden. It's murky, in a golden
sort of way that's almost clear,
almost not. Sunlight filters through,
there's a gold rope net rippling in shadow
along the bottom
Before, when all I could think of
was how poor I was, poverty in currency,
friends, my poor family, my poorer self
I was busy with the worries of the world.
The river doesn't know them;
that's why I come here.
She treats them like a stranger,
the new person in town with slick talk,
a long handshake and the twitch of a smile
that makes you want to keep moving.
The river is golden. There's always water;
it's long gone and here again, moving
all the while. In a little while
the sun will drop and light
will stream through the trees
across the river, which aren't golden either
but don't know it yet.



[51] DOS RIOS (VIII): t.s. eliot

Não sei muito acerca de deuses; mas penso que o rio
É um robusto deus castanho - taciturno, selvagem e intratável,
Paciente até certo ponto, reconhecido primeiro como fronteira;
Útil, indigno de confiança, como veículo de comércio;
Depois um simples problema para o construtor de pontes.
Uma vez resolvido o problema, o deus castanho é quase esquecido
Pelos habitantes das cidades - sempre, contudo, implacável,
Conservando as suas estações e as suas fúrias, destruidor, lembrando
Aos homens o que eles decidem esquecer. Sem honras, desfavorecido
Pelos adoradores da máquina, mas esperando, vigiando e esperando.
O seu ritmo estava presente no quarto das crianças,
No viçoso alianto do antepátio de Abril,
No cheiro das uvas sobre a mesa de outono,
E no serão à luz do gás de inverno.

O rio está dentro de nós [...]



[50] Comemorar 50 postas

O Cura di Sé comemora hoje 50 postas. Não é nada de especial. Mas também não tinha de o ser. Revela, sobretudo, a certain kind of persistência. Já não é mau, atendendo a que as modas são passageiras. Sem embandeirar em arco proponho-me atingir as 100 postas. Depois se verá.
Pretendo também comemorar a irrelevância deste blogue: está prestes a atingir 150 visitas! Não dá para publicar um livro com chamada do facto à capa, nem para receber prémio do Primeiro de Janeiro. Mostra tão somente que dois ou três amigos por cá passam, após insistência, e que os utilizadores aleatórios do Blogspot, de vez em quando, caem por aqui, sem saber ao que vêm.
Assim, tenho de me servir de citações de blogues mais famosos para comemorar devidamente as 50 postas do Cura di Sé. Também faz parte da arte de cuidarmos de nós próprios a utilização de estratégias contra o stress. Pescando no Fora do Mundo - no presente tão acidentalmente vilipendiado -, encontrei uma óptima estratégia para lidar com o stress.

[49] Trovadores: peter hammil

25.11.04

Na infância, foram as revistas do Círculo de Leitores que mo deram a conhecer: as páginas dedicadas aos discos a comprar publicitavam os Van der Graaf Generator. Ainda me lembro do Still Life. Mais tarde, já adolescente, apaixonei-me ao som das love songs do trovador a solo. Depois, para mim, houve um hiato de muitos anos. Talvez demasiados. Até que, em 2002, vieram a meu encontro recordações de outrora: nas prateleiras da Fnac apanhei o Clutch. E hoje, num novo acesso de nostalgia, descubro que Hammil lançou, já este ano, Incoherence , que é a continuous 41 minute piece.

Quem não beijou a amada ao som da balada My Favourite? Leia-se:

In my time I've told a lie or two,
I've been a deceiver, but believe me
what I now say is true.
There's no other way
I can express what I'm thinking of:
You're my favourite, you're the one that I love.

It's a one-horse race,
still I'm ready to place my bet.
I'm a pretty slow starter,
and I haven't quite caught up with it yet.
It seems so extraordinary
that you should care for me.
You're my favourite - how lucky can any man be?

You're my favourite -
will you stay the course with me?

You're my favourite of all time.
You're my favourite, can't you see?
You're my favourite of all time.
Say you'll stay the course with me.


[48] DOS RIOS (VII): jacques vidal.

23.11.04
O rio é um maravilhoso convite a viajar, tal como o perceberam todos os poetas e como experimentámos todos quando éramos crianças. O rio sugere-nos e diz-nos: «Embarca, parte, sai da tua terra, corre para a aventura». No rio, o homem mostra-se a si mesmo novamente tal como é. É uma antropofania mediada pelo rio. Goethe faz-nos participar das suas maravilhas: «Nas margens do rio que escorria já sentia cantar toda a minha vida». Somos capazes de ficar a ouvir durante horas o rio a correr porque o rio anuncia-nos a vida, essa maravilhosa chama biológica. Nós estamos a caminho e o rio exprime isso muito bem: todo o rio se dirige para o mar, para o Oceano. Cada rio anuncia o Oceano antes de o vermos. É símbolo do invisível.

J.P. Caponigro, Prelude in Gray

[47] DOS RIOS (VI): jacques prevért.

Teus jovens seios brilhavam ao luar
mas ele atirou
o gélido calhau
a pedra fria do ciúme
no reflexo
da tua beleza
que dançava nua nas águas do rio
no esplendor do verão.


Brigitte Carnochan, Water Nude #7

[46] DOS RIOS (V). jorge l. borges

Somos o tempo. Somos a famosa
parábola de Heráclito, o Obscuro.
Somos a água, não diamante duro,
a que se perde, não a que repousa.
Somos o rio e somos esse grego
a olhar-se no rio. A sua imagem
muda na água do espelho entre as margens,
no vidro que varia, fogo cego.
Somos o rio vão, predestinado
rumo ao seu mar. De sombra está cercado.
Tudo nos diz adeus, tudo nos deixa.
A memória não cunha moedas lesta.
E no entanto há algo que ainda resta
e no entanto há algo que se queixa.

Franz Heigl, Down the River I


[45] DOS RIOS (IV): d.m. turoldo.

Rio do meu Friuli, pobre
rio, vasto, de saibro
onde apenas uma ou outra poça de água
acolhia, no verão, os nossos
corpos brancos de criança
semelhante a baptistério selvagem!

Mas mais amado ainda é o outro
rio que por dentro me atravessa,
rios de seguras águas lustrais,
das suas margens espero, ó Pai,
que a tua voz me chame
e diga: «Ó filho!».

É este o meu Jordão
rio do meu exílio
e da minha sede mais verdadeira:
rio percorrido por secretas
águas, como o rio
da minha infância.

[44] DOS RIOS (III): mario luzi


O rio está parado. Dormita –
essas malhas
dos seus vibrantes reflexos –
depõe
o dorso e a preguiça
nesse meridiano cintilar
de estrelas fátuas, moliços.
Mas não está feliz,
não se ri,
como parece
olhando seus raios e seus deslumbramentos
seu ócio
o nume.
Falta-lhe, rio,
a sua fluvialidade,
a alma, a ventura.
Ou pelo contrário é verdadeiro paz
para ele essa paciência
na quietude
e no êxtase
suprema concordância?

Edvard Münch, Plenilúnio

[43] DOS RIOS (II): hermann hesse.

- Também aprendeste esse segredo do rio, quero dizer, que o tempo é coisa que não existe?
- Sim. Queres dizer que o rio está em toda a parte ao mesmo tempo, na nascente, na foz, na catarata, no molhe, na corrente, no oceano e nas montanhas, em toda a parte, e que para ele existe apenas o presente e não a sombra do passado nem a sombra do futuro?



Edvard Münch, Inger

[42] DOS RIOS (I): matsuo bashô.

A água está tão fria, como pode
a gaivota adormecer?


Thea Schrack

[41] Aonde me levas, minha arte?

Dove mi porti, mia arte?
in che remoto
deserto territorio
a un tratto mi sbalestri?

In che paradiso di salute,
di luce e libertà,
arte, per incantesimo mi scorti?

Mia? non é mia questa arte,
la pratico, la affino,
le apro le riserve
umane di dolore,
divine me ne appresta
lei di ardore
e di contemplazione
nei cieli in cui m’inoltro...

Oh mia indecifrabile conditio
Mia insostenibile incarnazione!

Mario Luzi (1994). Viaggio terrestre e celeste di Simone Martini.

[40] Ainda sobre a Virga Ardentis (Fim)

20.11.04
Em que homem e mulher, juntos - e cada qual uno em si -, olham na mesma direcção. O sentimento a que chamamos amor anda perto disto. Ou não?



Edvard Münch, Head to Head

[39] Dissertar sobre a Virga Ardentis (IV)



(PiotrKowaliK-The Cross We Choose to Bear- Part Three)
(citado no Xupacabras)

[38] Dissertar sobre a Virga Ardentis (III)


Edvard Münch, Fertilidade

[37] Dissertar sobre a Virga Ardentis (II)

19.11.04

Entretanto, Cloridia tinha esticado um braço atrás de si e, pegando na mão com que a penteava, puxara-me para seu lado. Depois, encostou levemente a cabeça ao meu peito e suspirou.

- Agora, tens de me desenriçar os cabelos da nuca, mas sem me magoar: as riças da nuca são mais encaracoladas, mas também mais frágeis e sensíveis.

Dito isto, fez-me sentar à frente dela, em cima da cama alta, e pôs a cabeça no meu regaço, de cara para baixo, mostrando-me o pescoço. Ainda atordoado e confuso, senti nas virilhas o calor da sua respiração. Recomecei a pentear-lhe os caracóis. Sentia a minha cabeça completamente vazia.

- Ainda não te expliquei como usar a verga com sucesso – recomeçou lentamente, enquanto a sentia a acomodar-se melhor na sua posição. - Antes de mais, é bom que saibas que a natureza apenas utiliza um único mecanismo em todas as suas operações, e só ela pode explicar o movimento da verga. Em primeiro lugar, é necessário mergulhar a ponta da verga numa matéria qualquer, possivelmente húmida e quente (como o sangue ou outros humores), que esteja relacionada com quanto se procura. Isto porque o tacto, por vezes, descobre aquilo que os olhos não podem. Depois, pega-se na verga entre dois dedos e coloca-se à altura do ventre. Também se pode pôr em equilíbrio no dorso da mão, mas a meu ver não funciona. Depois, deve-se prosseguir na direcção em que se pensa esteja o que procuramos. Vai-se para a frente e para trás, para cima e para baixo várias vezes de modo a que a verga se entese; e, assim, tem-se a certeza de que a direcção embocada é essa mesmo. A inclinação da verga, de facto, é a mesma da inclinação da agulha da bússola: responde a uma atracção magnética. O importante, com a verga, é nunca agir bruscamente, caso contrário rompe-se o volume de vapores e exalações provenientes do lugar procurado e que, impregnando a verga, fazem-na empertigar-se na direcção certa. De vez em quando, é bom ter nas mãos os dois cornos que estão na base da verga, mas sem apertar em demasia e de modo a que a parte superior da mão esteja virada para o chão e a ponta de verga esteja sempre apontada para a sua finalidade. Por outro lado, também é bom que saibas que a verga não se movimenta nas mãos de todos. É preciso um dom particular e muita arte. Por exemplo, não se movimenta nas mãos de quem tem uma transpiração de matéria grosseira, rude e abundante, uma vez que tais corpúsculos vão romper a coluna de vapores, exalações e fumos. Mas por vezes, também acontece que a verga não se move nas mãos de quem já a utilizou com sucesso. Não é que isso alguma vez me tenha acontecido, por amor de Deus. Mas pode acontecer algo que altere a constituição de quem tem de manejar a verga e lhe faça fermentar o sangue com maior violência. Pode haver algo na comida ou no ar que produz sais acres e ácidos. Ou então, um trabalho demasiado violento, vigílias nocturnas ou estudo, podem criar uma transpiração acre e rude que passa das mãos para os interstícios da verga e confunde o caminho à coluna dos vapores, impedindo-a de se mover. Isto porque a verga funciona como catalisador dos corpúsculos invisíveis, como um microscópio. Se visses o espectáculo que é quando a verga, finalmente, alcança...

Cloridia calara-se. Cristofano tinha batido à porta.

- Pareceu-me de ter ouvido um grito. Está tudo bem por aí? – perguntou, ofegante, o médico, que tinha subido as escadas a correr.
- Nada de preocupante. O nosso pobre aprendiz aleijou-se ao ajudar-me, mas não foi nada de importante. Saúdo-vos, senhor Cristofano, e obrigada – respondeu Cloridia com subtil hilaridade.

Eu tinha gritado. E, nesse momento, exausto de prazer e vergonha, jazia deitado na cama de Cloridia.

(R. Monaldi & F. Sorti (2004). Imprimatur. O segredo do Papa. Lisboa. Ed. Presença, 389-394).

[36] Dissertar sobre a Virga Ardentis (I)


- O que é, então, a verga ardente ou tremente, monna Cloridia – perguntei.
- A vossa verga e o vosso cajado consolaram-me – recitou. – Salmo 22.


Suspirei de alívio.

- Não a conheces? É um simples ramo bifurcado de nogueira, com um pé e meio de comprimento e grosso como um dedo, amadurecido não mais do que um ano. Também é chamada verga de Palas, caduceu de Mercúrio, varinha de Circe, verga de Aarão, cajado de Jacob. E também, verga divina, luzente, saliente, transcendente, cadente, superior: tudo nomes dados pelos italianos que trabalhavam nas minas de prata viva de Trento e do Tirol. Foi comparada ao bastão augural dos Romanos, que o tinham como substituto do ceptro; à verga utilizada por Moisés para fazer sair água da rocha; ao ceptro de Assuero, Rei dos Persas e dos Medos, de quem Ester – por te beijado a sua extremidade – obteve tudo o que pedia.

E mergulhou numa explicação de rara e lúcida doutrina. Isto porque, como bem me lembrava, Cloridia não era uma simples meretriz, era uma cortesã: e não havia mulheres como as cortesãs, que sabiam acompanhar as Artes do Amor com igual erudição.

(R. Monaldi & F. Sorti (2004). Imprimatur. O segredo do Papa. Lisboa. Ed. Presença, 389-394).

[35] Meu irmão, toca a erguer!


Meu irmão, a aurora vem
feita de luz e esplendor
ofertar à noite o véu.

Sorve já a matutina
bebida que a alva traz
e, como se presa fosse,
toma a alegria do dia
pois da tarde nada sabes...

Meu irmão, toca a erguer!
olha a festa da manhã
no jardim gelando o vinho.
não durmas, é hora de levantar.

E, como se presa fosse,
toma a alegria do dia
já que sob o pó da terra
longo será o teu sono.

Ibn-Abdun Al Yabury - poeta de Évora, séc. XI
(cortesia Palácio dos Balcões)

[34] NA ESCRIVANINHA: o desafio de nos questionarmos

16.11.04

Byron Katie (BK) criou um método, The Work, que se propõe libertar-nos da nossa confusão interior. Não se trata de um dogma espiritual ou filosófico: é uma experiência terapêutica a ser vivida.

A técnica terapêutica fundamental é a do Turn around, a técnica da inversão. «Enquanto considerarmos que as causas dos nossos problemas estão fora de nós e supusermos que algo ou alguém é responsável pelo nosso sofrimento, a situação não terá qualquer solução ou esperança de resolução. [...] Recordai a verdade a vós mesmos e conquistareis a liberdade», diz BK. Trata-se, portanto, de um trabalho profundo sobre as nossas projecções.

O MÉTODO
«Por detrás de cada sensação desagradável esconde-se um pensamento que não é verdadeiro para nós», diz KB. Quando sentimos um certo mal-estar é necessário que façamos um trabalho de investigação: submeter o nosso pensamento a quatro questões, que são sempre as mesmas.
A propósito desse tal pensamento, perguntemo-nos, deixando que a mente coloque as quatro questões e o coração responda:

1) Isto é verdade?
Escreva ou enumere diferentes desenvolvimentos deste pensamento.
2) Pode absolutamente confirmar que é verdade?
Tem provas concretas daquilo que afirma? Se sim, quais são? Que elementos lhe permitem afirmá-lo com certeza?
3) Que reacções lhe suscitam estes pensamentos?
Entre em contacto com os sentimentos que acompanham tais pensamentos. E que comportamentos provoca?
4) O que seria de si sem esses pensamentos?
Imagine-se livre de semelhante cenário. O que faria de diferente? Em que medida a sua vida seria diferente?

Agora, pode voltar à sua frase. São possíveis inúmeras espécies de inversão: inverter o pensamento dirigindo-o a si mesmo, dirigindo-o ao outro ou invertê-lo no seu contrário. Por exemplo, a frase «A V. tem de me amar», pode ser invertida em «Eu tenho de me amar a mim», «Eu tenho de gostar da V.», «A V. não tem de gostar de mim». Inverta a afirmação inicial à medida da inversão que considera ser mais próxima da sua realidade.

COMENTÁRIO
Enfim, poderá parecer simplista e redutor como método de auto-terapia: tudo se reduz a fazer quatro perguntas? E é suficiente trabalhar a nível cognitivo? E as outras áreas da experiência humana, tais como as sensações, as emoções e os comportamentos?
Por outro lado, lendo o livro - sobretudo, os inúmeros trechos de diálogos terapêuticos -, fica-se com a ideia de que BK utiliza outras técnicas mais amplas e eficazes, não se limitando à repetição mecânica das magical four questions.
KB utiliza uma abordagem integrada, quer ela o reconheça ou não, apesar do focus nos processos cognitivos. Nos tais trechos de diálogos terapêuticos reconhecem-se, pelo menos, quatro diferentes abordagens: a cognitiva (A. Ellis e a REBT; A. Beck e TC), a Gestalt (quando KB trabalha «sobre» o corpo do cliente e procura seguir o continuum de consciência do cliente), a gramática transformacional de Bandler e Grinder (na maneira como estimula respostas completas) e a abordagem psicanalítica (apropriação das projecções através do turn around).
A autora tem conhecido enorme sucesso nos EUA e em França. Aqui entre nós a moda ainda não pegou, se é que vai pegar. Os seus workshops, em que aplica ao vivo os princípios e os métodos do The Work, são extremamente interessantes (pelo que dizem os participantes e os observadores) e eficazes do ponto de vista terapêutico.
Espanta, todavia, que o livro (falo da edição que possuo) não tenha uma única referência bibliográfica a, pelo menos, um dos autores que acima listei! É tudo farinha do saco de KB? Não me parece.

[Byron Katie(2002). Loving what it is: four questions that can change your life. Random House]

[33] De degrau em degrau

A mim acontece-me, um anseio de partir, nas manhãs solarengas e frescas. Mas depois... a hesitação. Com os anos fui aprendendo: enquanto hesito... arranco e vou! Acting out, dirão alguns. Eu digo, simplesmente, seguir a primeira intuição. Ou a segunda, quem sabe...

Assim como as flores murcham e a juventude cede à velhice,
Também os degraus da vida,
A sabedoria e a virtude, a seu tempo,
Florescem e não duram eternamente.


A cada apelo da Vida deve o coração estar pronto,
A despedir-se e a começar de novo
Para, com coragem e sem lágrimas,
Se dar a outras novas ligações!

Em todo o começo reside um encanto
Que nos protege e ajuda a viver.
Serenos, transponhamos espaço após espaço,
Não nos prendendo a nenhum como a um lar;
Ser-nos corrente ou parada
Não quer o espírito do Mundo,
Mas de degrau em degrau elevar-nos e aumentar-nos.

Mal nos habituamos a um círculo de vida,
Íntimos, ameaça-nos o torpor;
Só aquele que está pronto a partir e parte
Se furtará à paralisia dos hábitos.

Talvez também a hora da morte
Nos lance, jovens, para novos espaços.
O apelo da Vida nunca tem fim...

Vamos, coração, despede-te e cura-te.

(H. Hesse)

[32] A propósito de umas filmagens em teatro de guerra

As decisões têm preço. Decidir a guerra tem um custo elevadíssimo. Decidir a «não guerra» que preço teria? Porventura, igualmente elevado em ameaças e terrorismo.
Enquanto não nos decidimos, veementes, pela paz, que a nossa consciência não se admire de escândalo, mas que também não fique calejada perante o horror. Os soldados, quando vão para a guerra, só têm um mandamento.

Primo comandamento di tutti gli eserciti:

tu non avrai altra ragione
all’infuori della ragione (impazzita)
di colui che ti manda.

I soldati devono solo uccidere
ed essere uccisi.

[D.M. Turoldo (1987). Il grande male. Poesie]

[31] To Mother Earth by Sigur Rós

15.11.04
Our Mother,
who art in Earth,
Hallowed be Thy name.

Thy kingdom come.
Thy will be done
On us as it is in you.

As you send Thy angels every day,
Send them to us aswell
And forgive us our trespasses
As we forgive those
Who trespass against you.

And lead us not into sickness,
But deliver us from evil,
Because yours is the earth
And the body
And the health.

Amen.

(Sigur Rós, Hún Jörð in Von)

[30] Entrevista a Mario Luzi


CURA DI SÉ apresenta a entrevista realizada por Antonella Palermo a Mario Luzi no dia 14 do mês passado, dia fatídico em que foi nomeado Senador vitalício. Esta entrevista é um testemunho interessante e precioso narrado na primeira pessoa.

Mario Luzi ha 90 anni. A festeggiare il poeta fiorentino si sono ritrovati intellettuali e rappresentanti del mondo della politica, convenuti nel capoluogo toscano per convegni e letture pubbliche di sue opere inedite. Anche altre città italiane hanno voluto rendere omaggio in varie forme a questo illustre protagonista della nostra storia culturale.Libri accatastati in ogni angolo, quadri che lasciano poco spazio libero alle pareti. È il salottino della casa di Mario Luzi, sull’Arno. Mi ha ricevuto nel pomeriggio del 14 ottobre, giorno che avrebbe aperto la strada al suo battesimo sugli scranni del Parlamento italiano, in qualità di senatore a vita. È un novantenne affaticato che vuole restare aggrappato alla vita e riesce a farlo con straordinaria lucidità, ironia, affabilità, umiltà. È il ‘poeta’ per antonomasia nel panorama contemporaneo, ma spesso ci si dimentica che è stato anche traduttore e drammaturgo. Certo i versi li produce con preziosa e rara passione. Pesa ciascuna parola, non corre dietro al luccichio della fama. I suoi occhi vecchi, ma luminosi, sanno di maestro buono.

Qual è il suo stato d’animo di fronte alle numerose firme raccolte per la sua candidatura a Senatore a vita?
Mi fa piacere che almeno in alcune persone ci sia questa simpatia, questa stima.

Come fa i conti con la sofferenza?
La sofferenza è uno stato molto familiare all’uomo, non dico necessario, perché si può anche ipotizzare una vita felice che non conosce né il dolore né la sofferenza, però è uno sforzo dell’immaginazione, è un eccesso del sogno. In realtà io non conosco nessuno che non abbia sofferto periodicamente e qualche volta cronicamente, purtroppo. La sofferenza è un pedaggio che dobbiamo pagare per essere presenti nella vita, per essere nell’essere.

Lei ha detto spesso: “La mia poesia è più ricca di domande che di affermazioni”. Quali sono le sue domande del tempo presente?
Sono le domande sui nostri limiti: vorremmo spingerci sempre più in là, saperne di più, avere più aperture verso una conoscenza attendibile, che coincida addirittura con uno stato di ‘beatitudine’. Ad incalzare sono le domande che riguardano proprio il rapporto tra la nostra limitatezza è l’infinità. L’infinità si presenta periodicamente, ci richiama, ci affascina, ci sollecita, ma non ci dà mai delle risposte che possiamo ritenere definitive. Quindi l’una dimensione genera l’altra. Oggi purtroppo certe domande si sono aggravate.

Quali?
Quelle sul male, una presenza tutt’altro che provvisoria nell’universo. Ho sempre considerato il male il rovescio del bene. Però oggi io, di fronte a certi episodi (per es. la scuola di Beslan…n.d.r.), penso che il male sia anche fuori dalla responsabilità dell’uomo. Come un’immanenza non ancora debellata. Nel testo della Passione che scrissi (Per il Venerdì Santo del 1999 n.d.r.) faccio domandare da Gesù al Padre: “Perché? Sei tu che lo ammetti, o è qualcosa su cui Tu non hai potere?”.

E la guerra, il male della guerra? Lì c’entra l’uomo…
Quella invece è una volontà sinistra, una volontà nefasta, sbagliata.

E qui il ruolo della poesia quale può essere?
Tutto e nulla!

So che lei ha avuto modo anche di incontrare persone che poi avrebbero preso la via del terrorismo e che sono state toccate nel profondo da alcune sue poesie…
Mi è capitato in quegli anni ‘roventi’. Persone che erano in clandestinità e la lettura di certe cose, anche mie, le ha aperte ad altri discorsi, altri orizzonti. Anche per qualchedun’altro che stava scontando la pena è stato utile leggere qualche mio testo.

«Dottrina dell’estremo principiante» è il titolo della sua ultima raccolta: perché vale la pena secondo lei tornare ad una semplicità di vita?
Questo recupero del principio originario della vita e della partecipazione alla vita degli uomini come delle altre creature, è una richiesta che penso nasca dall’angoscia dell’uomo contemporaneo, dall’insoddisfazione, dall’insicurezza che vive, ma anche dalla volontà di riscoprire la meraviglia della vita. Bisogna tornare nella condizione di apprezzarla, di viverla, di stupirsi di questa vita. Penso che i drammi a cui assistiamo ci portino a desiderare questa nudità e semplicità. Bisogna rientrare nel vivente, nell’innocenza e nella forza del vivente. Con tutto quello che vediamo di orribile, il vivente è qualcosa che supera tutto.

Lei si definisce ‘principiante’: cosa ha ancora da imparare?
Tutto! Perché le eperiene che si fanno lasciano integro sia il quesito sia anche il prodigio della vita. Non possiamo essere così presuntuosi da aver capito tutto. Bisogna riconoscere che il più alto grado di consapevolezza è quello di non essere che umilissime creature presenti nel vivente. Credo che il principiante sia nella condizione più totale di aderenza alla vita e al vero.

Chi e cosa l’ha segnata nella fede in Gesù Cristo?
Ho avuto una madre meravigliosa, mi dava l’esempio, in senso caritativo, soprattutto. Io l’ammiravo, le volevo bene, naturalmente. Non era una donna di grande cultura, però aveva certe sicurezze interiori e mi faceva vedere già da allora cosa c’era dentro certe forme, certi riti della fede. Poi io mi sono fatto nel tempo anche una cultura molto fondata sui Padri della Chiesa, Sant’Agostino per esempio.

Adesso per lei cosa vuol dire aver fede?
Non disperarsi, non disperarsi mai totalmente.

Il Papa ha appena varcato la soglia del 26° anno di Pontificato. Come sente lei, quasi un suo coetano, di sintetizzare la sua missione apostolica?
La parola ‘apostolica’ è quella che lo definisce meglio. Il suo pontificato è stato apostolato, più che altro, anche Magistero, certo, ma soprattutto apostolato. E in questo non ha mai interrotto la sua azione, ha chiesto a sé stesso e ha trovato in sé stesso la forza di portare sempre più avanti questa missione, vedendo appunto il mondo nel suo complesso. L’ha fatto sì da padre della Chiesa, da responsabile di tutto l’universo cristiano, cattolico, ma più ancora come uomo, che ha visto i rischi dell’umanità planetariamente. È l’unica mente abbastanza aperta e coraggiosa da considerare l’umanità nel suo insieme, come un’unità da non lacerare con guerre e contrapposizioni. È questo un grande tema che lui ha proposto e che ha anche esemplato fino a questi ultimi tenaci sforzi che sta facendo per superare la sua malattia, la sua quasi afasia. Un uomo che ha avuto una visione totale del mondo e lo ha anche aiutato a risolvere nodi politici importanti.

Ha rimpianti?
In alcune circostanze potevo essere di aiuto, di beneficio, invece poi ho fatto male certe cose, ho fatto poco. E poi ci sono anche cose che non ho fatto, omissioni. È un bilancio che credo sia irreparabile, per chiunque.

Il suo rapporto con Firenze come si esprime nella sua poesia?
È la mia casa. Ho appreso qui quelle cose che non si cancellano mai, che sono basilari, intrinseche. Molti mi domandano: “Come ha fatto a vivere in questa città-museo?”. Ma non è un museo, per me!

Che carattere crede di avere?
Mi sembra di essere un uomo abbastanza mite. Con gli anni sempre meno irritabile, forse…

Con gli anni di solito si tende a diventare più testardi?!
La pertinacia, quella non manca, però sono portato ad irritarmi meno, nel senso che ammetto anche l’opinione altrui, le critiche…

Qual è il più bel regalo, augurio che vorrebbe ricevere per i suoi 90 anni?
Mah, questo che mi fate voi, interessandovi un po’ a quello che ho fatto, a quello che non so se sarò ancora in grado di portare avanti, e che è stato il mio lavoro di una vita.

Ha paura?
Di niente. Ho paura non della morte, ma di certe menomazioni che possono precederla, certe infermità… penso un po’ con spavento a queste cose. La morte si teme da giovani. Poi ci si abitua sia alla vita che alla morte. A un certo punto tutto il mondo che si è vissuto o quasi tutto, tutte le persone, sono già ‘di là dalla siepe’. Arriva un momento in cui quindi si è in continua corrispondenza tra queste due dimensioni. La morte è una specie di passo molto naturale che si deve fare. Poterlo fare da uno stato di serenità, di compiutezza, e anche di lucidità è augurabile rispetto a quelle circostanze avverse che possono umiliare, affliggere, provare.

È molto bello questo inno alla vita che si coglie nelle sue parole e che forse vanno a ripescare in quella “Alla vita” che fa parte dei suoi esordi poetici…
Mi pare che tra i primi e gli ultimi ci sia un rapporto molto stretto, che gli ultimi ritornino molto volentieri.

Cosa farà il 20 ottobre?
Il 20 ottobre non sarà una giornata tranquilla come avrei desiderato.

Molti auguri.
Grazie.

Di Antonella Palermo
(cortesia de Alice.it)

[29] Reinventar a vida


Desconfio de quem propagandeia grandes reformas a nível macro. Na realidade, só considero possíveis as micro-reformas. Como diria C.S Lewis (ou seria Lapalisse?) «o que está em cima não se aguenta sem o que está em baixo». A eventual grande reforma só se aguenta se começar por uma reforma ao nível dos indivíduos e dos grupos mais pequenos, sendo que tem algo de intimamente pessoal e personalizável. Afirmo, neste sentido, o primado da pessoa como fulcro da mudança.

Vem esta conversa a propósito de um livro de cura di sé que propõe precisamente esta possibilidade de uma reforma que é, antes de mais, pessoal, centrada no sujeito e nas suas vivências. O convite é a que se reinvente a própria vida. Como?

A Schema Therapy de Jeffrey Young tem como postulado de base a existência de uma série de lifetraps (armadilhas existenciais: modos de pensar, de sentir, de agir e de nos relacionarmos connosco próprios e com os outros) que são uma espécie de guião dolorosamente ineficaz e repetitivo, que aprendemos em tempos precoces e fases cruciais da nossa existência, que se foram reforçando ao longo do tempo e que continuamos a recitar, com fidelidade, até ao dia em que tomamos consciência da necessidade de escrevermos um novo argumento mais eficaz e criativo, um novo guião existencial para a nossa vida. Numa palavra... a necssidade de reinventar a própria vida.

O livro Reinventing Your Life. The Breakthrough Program to End Negative Behavior... and Feel Great Again é a versão «popular» e auto-terapêutica da Schema Therapy. Começa por definir o conceito de lifetrap e compreender a sua etiologia, desenvolvimento, sintomatologia e dinâmica no contexto da vida da pessoa. Num segundo momento, dá sugestões ao leitor para que identifique qual a lifetrap em que predominantemente se encontra bloqueado. Por fim, propõe uma filosofia da mudança – a tal reforma de vida que acima referi – em que sugere, em concreto, como libertar-se das armadilhas existenciais que nos cristaliza em modalidades ineficazes e obsoletas de pensar, sentir e interagir com os outros
(continua).

[28] ... porque hoje é sábado

13.11.04

BOM DIA... porque hoje é sábado, como dizia a canção brasileira.

Em breve será feita actualização NA ESCRIVANINHA referindo dois livros para a cura di sé e outro de informação musical:

- Gian Piero Quaglino (a cura di) (2004). Autoformazione. Autonomia e responsabilità per la formazione di sé nell'età adulta. Milão. Raffaello Cortina Editore.

- Jefrrey Young & Janet Klosko (1993). Reinventa la tua vita. Scoprite come modificare voi stessi e liberarvi dalle trappole che vi impediscono di cambiare la vostra vita. Milão. Raffaello Cortina Editore (título original publicado em 1993 nos EUA: Reinventing your life. The Breakthrough Program to End Negative Behavior... and Feel Great Again);

- M. Marino (2003). Sigur Rós. Sinfonie dai mari del Nord. Roma. Arcana libri.

[27] NA ESCRIVANINHA

12.11.04

Por que é que os futebolistas, habitualmente, colocam as mãos em forma de concha em redor das partes pudendas na marcação de um livre? Qual o significado do aperto de mão? Por que é que Saddam Hussein saudava as multidões de mão aberto para cima e Hitler de mão aberta para baixo? Para onde olham as mulheres quando encontram um homem e o homem quando encontra uma mulher? Como posso ter a certeza de o meu interlocutor diz a verdade e não mente? Como é que sei se uma mulher/homem está interessado em mim, ou não?

Barbara Pease & Allan Pease (2004). The Definitive Book of Body Language. Londres. Orion.

Autores de sucesso - com títulos do género «Por que é que os homens não escutam e as mulheres não sabem ler mapas», ou «Por que é que os homens mentem e as mulheres choram», ou ainda, «Por que é que os homens só conseguem fazer uma coisa de cada vez e as mulheres nunca param de falar» -, Pease & Pease ampliaram o original Body Language (de 1997) do segundo Pease e apresentam este calhamaço de 386 páginas (em papel Sarvol e capa com UV localizado).
O corpo diz. O corpo comunica. O corpo tem razões que a razão desconhece. Mas o que diz o corpo quando fala e o que exprime quando assume determinada postura? O que dizem as mãos e os olhos, as pernas e o sorriso, a orientação do corpo e os gestos mais simples?

Não se trata de um tratado de semiótica corporal de tipo determinista: várias interpretações são possíveis e variam de cultura para cultura. Contudo, há padrões que permitem codificar um verdadeiro alfabeto corporal. É o objectivo dos dois autores. Começam pelas mãos, passam para o riso e o sorriso, interpretam os sinais dados pelos braços, analisam as diferenças culturais na expressão corporal, passam pelas pernas, pelos gestos que incluem as mãos e o rosto e, por aí adiante, não descurando a semiótica do fumar, do sentar-se, da proximidade e da distância entre interlocutores...

Longe da panaceia que os livros deste género costumam querer apresentar, The Definitive Book of Body Language é um livro estimulante e actual - com variados exemplos do mundo de hoje (a comunicação gestual de gente tão conhecida como Bill Clinton, Tony Blair, François Miterrand, George Bush, Yasser Arafat, Lady Di, David Beckham, Barbara Streisand, etc) -, que informa e diverte, dando ao leitor a possibilidade de interpretar o significado de determinados gestos e, assim, inferir os pensamentos e as emoções do seu interlocutor.

[26] Rememorar Coimbra

10.11.04

Gosto de ir a Coimbra no Outono quando chove. Da janela do consultório observo o manto leitoso da chuva a derramar-se sobre as vertente alcantiladas da Serra da Rocha.
O verde dos pinhais esbate-se; dá a sensação de um nevoeiro na baía.

Ouvir a chuva a cair e o pulsar ritmado do relógio de sala no corredor. Um beat sereno. Pacificador. Num silêncio ocupado sinto-me criança em braços de mãe a dormitar embalado por esta sinfonia natural.

Hoje foi dia de sol e frio em Coimbra. Assim que desço do Alfa encanta-me o cheiro a húmus e a lareira a arder. Recordações de tempos imberbes. Bonitas lembranças. Que agora rememoro com prazer.

[25] Molière (II) ou o sentido deste blogue

9.11.04

Por outro lado, é verdade que as doses concentradas de problemas centram cabalmente o escopo deste blogue: perturbar a calma para não me esquecer de existir.
Amanhã, passo o dia em Coimbra a escutar: outra vertente da cura di sé.

Concluo a inserção desta noite com Philip Roth (Portnoy's Complaint, 1969):

- [...] Dá-me vontade de gritar... posso?... Porque talvez seja disso que preciso acima de tudo,
de uivar, soltar um uivo puro, sem palavras entre mim e isso!... Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhh!
PONTO CULMINANTE
- Aí está - disse o terapeuta. - Talvez agora possamos começar. Sim?

[24] Molière tinha razão

BUONA NOTTE!
Há dias assim: um cliente a resmungar e a mentir, uma avaria no velhinho Clio, uma discussão inútil com quem se gosta. A dose podia vir, justamente, doseada. Hoje, a discussão, amanhã a avaria, depois de amanhã a resmunguice. Enfim, tudo menos várias doses no mesmo dia. Hoje foi um concentrado.

Dou por mim, ao cair do pano, a recompor os fragmentos de um dia exigente e fracturante. Também isto é cura di sé: recompor os cacos, dar sentido aos conflitos, integrar o fracasso. Escolhi como corolário uma frase de Molière (Le Médecin Malgré Lui, 1666-1667) que encontrei num incipit de um capítulo de um livro sobre as emoções:

«[...] Devemos
examinar-nos por muito tempo
antes de pensarmos em condenar
os outros»

[23] Os poetas alegram-se uns aos outros

8.11.04

Versi scritti per tenere allegro Montale

Cosa si prova Montale, a essere un idolo
- e non solo della caverna, pure della tribù – sollucchero
che pochi in vita loro, pochi delibarono?
Guarda un pò che mi fa venire in mente la festa
che, mi avvertono, ti prepara Genova,
la tua famosa-sparagnina Genova dei proverbi
che insomma non uccide i suoi profeti e nemmeno li lapida.

Non l’amare ma l’essere amati
è la somma attività – scrive sulla natura di amore
qualcuno di quei disquisitori platonici
di cui si parlottava, come succede com te, raramente, in tempi molto grami,
aspirando macedonia dopo il caffè
sotto l’occhio peperino
e il cruccio bonario e protettivo del vecchio Cesare
di poi debitamente accompagnato a sepoltura, almeno da me.

Ti auguro sia giusta la tesi di quei filosofi
e tu ferva dell’amore che ti hanno dato
molti, li abbia o non li abbia avuti nella tua stretta manica.
E, va bene, di vere domeniche il poeta non ne ha,
la sua festa, d’accordo, è solo quel che fa o se non fa preordina.
Ma non si è solo poeti, si è anche – gran sollazzo
del nostro belzebù E. Sanguinetti - «anime».
Alla tua dunque, carissimo, urrah!


Esta poesia foi escrita por Mario Luzi em 1976 e publicada numa miscelânea intitulada I poeti a Montale, editada pela Câmara Municipal de Genova por ocasião dos oitenta anos do poeta.
«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»
Buona sera, o meglio, buona notte!



[22] TRILUSSA (1871-1950), poeta satírico

7.11.04

Trilussa (http://www.trilussa.org.uk/) é o poeta romano Carlo Alberto Salustri, que escolheu este pseudónimo a partir de um jogo de letras com o seu apelido Salustri.
É autor de um grande número de poesias em dialecto romanesco (dialecto de Roma), algumas das quais em forma de soneto. Longe de ser um intelectual – Trilussa não brilhou nos estudos – a musa da sua inspiração eram as ruas de Roma.
Os seus primeiros versos, publicados num jornal local, foram muito bem recebidos pelos leitores. A fama de Trilussa foi crescendo e, entre 1920 e 1930, a sua notoriedade atingiu o ponto mais alto. Contudo, nunca frequentou os círculos literários: continuava a preferir as osterie [tabernas].
A poucos dias da sua morte foi-lhe atribuído o título de senador vitalício por elevado mérito no campo literário e artístico. Quando tomou conhecimento da notícia, Trilussa disse à sua velha governanta «Siamo ricchi!»[Estamos ricos!], pois bem sabia que o título não era muito mais do que um cargo honorífico.
De seguida, três capolavori de mestre Trilussi: All'ombra, La vorpe sincera e Er ministro novo.
«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»«»
All’OMBRA
Mentre me leggo er solito giornale
spaparacchiato all’ombra d’un pajaro,
vedo un porco e je dico: - Addio, majael! -
vedo un ciuccio e je dico: - Addio, somaro! -

Forse ‘ste bestie num me capiranno,
ma provo armeno la soddisfazzione
de potè di’le cose come stanno
senza paura de finì in prigione.

««««««««««««««««««««««««

LA VORPE SINCERA
Doppo dávé magnato una Gallina,
La Vorpe incontrò un Gallo:
Ma, invece d’agguantallo,
Lo salutò com una risatina.

- Co’te – je disse – num m’abbasta l’anima.
Ritorna a casa ché te fo la grazzia...
- Dunque – je chiese er Gallo – sei magnanima?...
Sì: - je rispose lei – quanno so’ sazzia.

»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»

ER MINISTRO NOVO
Guardelo quant’è bello! Dar saluto
pare che sia una vittima e che dica:
- Io veramente nun ciambivo mica;
È stato propiro il Re che l’há voluto! –

Che faccia tosta, Dio lo benedica!
Mó dà la corpa al re, ma s’è saputo
Quanto ha intrigato, quanto há combattutto...
Je n’é costata poca de fatica!

Mó va gonfio, impettito, a panza avanti:
Nun pare più, dar modo che cammina,
Ch’há dovuto inchinasse a tanti e tanti...

Inchini e inchini: ha fatto sempre un’arte!
Che novità sarà pe’ quela schina
De sentisse piegà dall’antra parte!

C. DAMIANI (a cura di) (2000). Le più belle poesie di Trilussa. Con disegni di Trilussa. Milano. Oscar Mondadori.

[21] Não se esquecer de existir

6.11.04

TRÊS PENSAMENTOS

É feliz aquele que todos os dias pode calmamente dizer: hoje vivi!
Que amanhã Júpiter nuble o céu ou o aclare com o sol mais vivo, a sua mente poderosa nunca poderá fazer com o que já foi não tenha sido, nem conseguirá que não esteja já acabado aquilo que preencheu o momento fugaz.

(Horácio, Liv. III, Ode 29)

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Ser optimista ou pessimista? A questão não é essa. Dizia Jean Monnet que é preciso ser-se determinado. E agora cito Bernanos que diz que é preciso ter «a esperança violenta das manhãs».
(Entrevista a J.-C. Guilleband in LIRE 12/2003, 122-124)

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Sou a maior autoridade dos EUA em matéria de viver sem nada. Vivo do ar, amor-próprio, beatas de cigarros, café de Cowboy, sanduíches de ovo e Ketchup.
(J. Mitchell, O segredo de Joe Gould)

[20] Enjoy life’s play of colour


Imagino que o dia se está a erguer timidamente colorido. Em redor há calma. É sábado. Os carros não passam para o trabalho nem para levar os miúdos à escola. No andar de baixo, a velha vizinha dá um primeiro berro ao marido para que não vista aquela camisa, que ela depois é quem tem de lavar e passar a ferro. Foi o meu despertador.

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Dou um «chega para lá» às cortinas do consultório e a luz estremunha-me. Imaginei e assim é: o dia está a erguer-se timidamente colorido. Peguei no Munch. In his own words do Poul Erik Tøjner e encontrei esta pérola: uma paleta de cores vivas para o meu dia.


Hope is pale green
eternally and ever beautiful.
Brown is steadfastness
fleeing your peace of mind
patient and strong
destiny is heaven's work

Yellow is the cheek of deceit
faithless and craft by nature.
Tell me, wherecan be they be found.

Joy is sky blue
a pleasure to see above.
The grave is always black
the source is gone forever. Shut your eyes
and enjoy life’s play of colour.

[19] Aos amigos e à vida


BUON GIORNO!

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Alla vita

Amici ci aspetta una barca e dondola
nella luce ove il cielo s’innarca
e tocca il mare,
volano creature pazze ad amare
il viso d’Iddio caldo di speranza
in alto in basso occulta distanza
e piangono: noi siamo in terra
ma ci potremo un giorno librare
esilmente piegare sul seno divino
come rose dai muri nelle strade odorose
sul bimbo che le diede senza voce.

Amici dalla barca si vede il mondo
e in lui una verità che procede
intrepida, un sospiro profondo
dalle foci alle sorgenti;
la Madonna dagli occhi trasparenti
scende adagio incontro ai morenti,
raccoglie il cumulo della vita, i dolori
le voglie segrete da anni sulla faccia inumidita.
Le ragazze alla finestra annerita
com lo sguardo verso i monti
non sanno finire d’aspettare l’avvenire.

Nelle stanze la voce materna
senza origine, senza profondità s’alterna
col silenzio della terra, è bella
e tutto par nato da quella.
(Mario Luzi, La barca, 1935)

Para ler ao som de Piango, prego e sospiro do mestre Luigi Rossi.


[18] Quando o amor cura

Saiu a 22 de Outubro o último livro do psiquiatra e etólogo Boris Cyrulnik - Parler d’amour au bord du gouffre. Odile Jacob -. É a sua quarta obra sobre o tema da resiliência, a capacidade de auto-cura e auto-reabilitação que nos permite enfrentar e superar as feridas psicológicas (o poço = gouffre) – das mais simples às mais graves – e fazer delas, até, uma alavanca de crescimento, um ponto de força do amadurecimento pessoal. Cyrulnik propõe como principal elemento da resiliência o AMOR...


TAGORE (Gitanjali, XLVI) prossegue:

Non so da qual tempo lontano
ti sei avvicinato a me,
Il sole e le stelle non possono
tenerti nascosto per sempre.

Quante volte, di ser e dimattina,
si sono uditi i tuoi passi
e il tuo messo è entrato nel mio cuore
e m’ha chiamato in segreto.

Non so perchè oggi la mia vita
è tutta in agitazione
e un senso di trepida gioia
atravversa il mio cuore.

E’ come se fosse venuto
il tempo di finire il mio lavoro,
sento tenue nell’aria il profumo
della tua dolce presenza.

[17] Fan battaglia i miei pensieri


Buona serata!
Ormai a quest’ora dovrei dire «Buona notte!» perchè è arrivata l’ora di andare a letto. Ad ogni modo, non posso andarci senza prima affidare al CURA di SÉ un piccolo pensiero del Mastro Luigi Rossi (1598-1653) che riassume la giornata d’oggi:

Fan battaglia i miei pensieri,
E al cor dan fiero assalto.
Così al core, empi guerrieri,
Fab battaglia, dan guerra i miei pensieri...


Stasera sono andato alla FNAC Colombo ed ho visto che è uscita una bella antologia di poesie de TAGORE tradotte in portoghese. A Tagore, ho imparato ad amarlo in italiano, soprattutto la poesia LXXIX di Gitanjali, che mi ricorda le giornate serene ad Eupilio proprio davanti al Lago di Como. In una serata estiva, mi innamorai al suono di queste parole:

Se non mi è dato d’incontrarti in questa vita
fa allora ch’io sempre mi ricordi
che non ti ho veduto –
che non lo dimentichi un solo momento,
che porti la stretta di questo dolore
nei miei sogni e nelle mie ore insonni.

Mentre i miei giorni passano
nell’affollato mercato di questo mondo
e le mie mani si riempiono
dei miei guadagni quotidiani,
fa ch’io sempre mi ricordi
che non ho guadagnato nulla –
che non lo dimentichi un solo momento,
che porti la stretta di questo dolore
nei miei sogni e nelle mie ore insonni.

Quando siedo sul bordo della strada,
stanco e dolente,
quando stendo il mio letto nella polvere,
fa ch’io sempre ricordi
che un viaggio lungo ancora mi attende –
che non lo dimentichi un solo momento,
che porti la stretta di questo dolore
nei miei sogni e nelle mie ore insonni.

Quando le mie stanze sono tutte addobbate
e i flauti suonano
e le risate echeggiano alte,
fa ch’io sempre mi ricordi
che nella mia casa non ti ho invitato –
che non lo dimentichi un solo momento,
che porti la stretta di questo dolore

nei miei sogni e nelle mie ore insonni.

[16] DANÇAR... in the Cosmic Ballet

2.11.04

Num fundo brilhante, como o clarão de um amanhecer, retalha-se a silhueta de um homem de braços abertos. Só se vê do tronco para cima e, por isso, não se percebe se dança ou se procura um equilíbrio. Ou é bailarino ou funâmbulo. Ou procura um equilíbrio suspenso no abismo ou desempenha a sua parte na dança da vida. O que vai dar ao mesmo.

Diz John D. Caputo (2001, On religion):
What do I love when I love my God? To a Buddhist, or to a Native American, or to a contemporary eco-feminist, the cosmos is not a blind and stupid rage, as Nietszche thought, but a friend, our element and matrix, the beggining and the end, the gentle rocking of a great cosmic womb, a friendly flux from which we take our origin and to which we return, like the steady beat of ten thousand waves in the sea. Then the love of God means to learn how to dance or swim, to learn how to join in the cosmic play, to move with its rhythms and to understand what we are each of us of no special import other than to play our party in the cosmic ballet.

[15] Silenciando a rua e a noite

Enquanto a chuva cai, silenciando a rua e a noite, «rabisco» estas palavras de introdução ao poema By This River de Brian Eno. Lembram-se do filme La stanza del figlio de Nanni Moretti? O pai, acabado de perder o filho, entra numa loja discográfica à procura de vestígios que consigam curar a ferida lancinante deixada por aquela morte precoce. O empregado lembra-se de que o filho costumava passar por lá. O pai, psicanalista, pergunta se há alguma coisa de interessante que o filho gostava de ouvir. O empregado diz que não se recorda. Mas depois vai-lhe buscar um Cd de Brian Eno, o Before and After Science, de 1977. Após a entrega, ouve-se o piano de Achim Roedelius a soletrar as notas iniciais de By This River a que responde a voz suave e calma de Brian Eno, dizendo:

Here we are stuck by this river
You and I underneath a sky
That’s ever falling down down down
Ever falling down

Through the day as if on an ocean
Waiting here always failing to remember
Why we came came came
I wonder why we came

You talk to me as if from a distance
And I reply with impressions chosen
From another time time time
From another time.

O mesmo piano e a mesma voz aparecerão já no fim do filme a anunciar a esperança de que a vida continua. A vida tem de continuar nos que ficam. Hoje, esta chuva e este silêncio evocam-me tudo isto: que a vida a bela, apesar de feia; que a vida é boa, apesar de dura; que a vida é verdadeira, apesar da morte. Ou melhor, precisamente por causa de ser feia, dura e destinada a morrer é que é bela, boa e verdadeira.

[14] The Winter Queen de Boris Akunin

1.11.04
Ontem, no último dia do mês, li de um fôlego The Winter Queen de B. Akunin, escritor russo, que ainda não está publicado entre nós. No estrangeiro, nomeadamente em Espanha, Itália, EUA e, claro, Rússia, tem vendido que é um disparate.
É a história de um jovem aspirante a comissário de polícia (Erast Petrovich) e dos seus primeiros passos no mundo da investigação criminal. Tudo começa em pleno jardim de São Alexandre (Moscovo) com um suicídio perpetrado por um jovem, no momento em que este, pasme-se, corteja uma donzela acompanhada pela sua governanta alemã. E mais não conto. Ambienta-se na Rússia de finais do século XIX, mas também passa por Londres, cidade em que, aliás, se situa o Winter Queen.

[13] Em louvor dos sonhos - Jan Garbarek

Mais um trabalho fantástico de Jan Garbarek: IN PRAISE OF DREAMS.
Acompanhado por Kim Kashkashian e Manu Katché, Garbarek destila, mais uma vez, uma sonoridade fantástica, que não me canso de ouvir: o Cd roda, roda e, quando acaba, volta ao princípio... num círculo virtuoso de paz e serenidade.

Na capa. Vinda de um fundo negro uma luz irrompe, forte: um sonho brota impetuoso do inconsciente.

[12] Possuir a beleza

Numa das leituras de verão, fui levado a questionar-me sobre a possibilidade de «possuir», no sentido de «levar comigo», a beleza dos lugares que visitei, das leituras que fiz, dos «objectos» artísticos que contemplei e, sobretudo, das pessoas que conheci. Inspirou-me John Ruskin (http://www.victorianweb.org/authors/ruskin/ruskinov.html) para quem só existe uma maneira de possuir efectivamente a beleza: ou seja, COMPRENDÊ-LA, tomando consciência em nós dos factores (psicológicos e visuais) que são responsáveis pelo sentimento que se lhe refere. Para tal, o meio mais eficaz de conseguirmos uma tal tomada de consciência é tentarmos descrever os lugares (objectos, pessoas, etc.) belos através da arte, da escrita ou do desenho, sem perdermos tempo a considerar se acaso teremos um mínimo de talento que justifique fazê-lo.
Umas férias assim, em busca da beleza, vale a pena passar. Mas não será, pelo contrário, o programa de toda uma vida, o de procurar compreender («ligar dentro» de nós), ler dentro (intus legere = buscar a inteligibilidade) de nós tudo o que experimentamos com os sentidos, conhecemos com a mente e o afecto, decidimos com a vontade e actuamos no concreto? Não será este o projecto que vale a pena viver: buscar a beleza! A beleza dos locais, das criações artísticas, e maxime, buscar a beleza das pessoas!
Haverá ainda espaço para a beleza? Haverá ainda tempo para a beleza? Será que ainda vamos a tempo de suplantar a fealdade com a beleza?

[11] O cheiro das religiões

No livro O senhor Ibrahim e as flores do Corão, de Eric-Emmanuel Schmitt, encontrei uma passagem preciosa sobre um inusual critério de diferenciação entre as religiões: o cheiro! O personagem principal, o senhor Ibrahim, é muçulmano, por isso, prefere o cheiro da mesquita. Ora leiam e depois reflictam sobre o cheiro da vossa fé!

Jogávamos a muitos jogos. Ele fazia-me entrar nos monumentos religiosos com uma venda nos olhos para que eu adivinhasse a religião, pelo cheiro.
- Aqui cheira a círios, é católico.
- Aqui é Santo António.
- Aqui cheira a incenso, é ortodoxo.
- É verdade, é Santa Sofia.
- E aqui cheira a chulé, é muçulmano. Não, na verdade, que raio de odor...
- O quê?! Mas é a Mesquita Azul! Um local onde podes sentir o odor corporal não é suficientemente bom para ti? Nunca cheiras dos pés? Enoja-te um local de oração feito para os homens, com homens presentes? Tens mesmo ideias de parisiense! Para mim, este perfume de meias, tranquiliza-me. Digo para comigo que não valho mais do que o meu vizinho. Sinto o meu cheiro, o dos outros e, portanto, já me sinto melhor!

[10] Quando se nasce há sempre esperança


EM AULYIA,
de Véronica Murguía (Ed. ASA)
diz-se que:

Aulyia não chorou quando nasceu [...].
A menina tinha um problema na perna.
Além disso, era muito pequena;
um cachorrinho silencioso que não chorava,
um rato do deserto.
Contavam as mulheres que cuidavam dela que,
quando se aproximavam da menina durante a noite,
esta seguia os seus movimentos com o olhar.
«É como se conseguisse ver no escuro»?,
sussurravam entre si.
Os velhos, o marido e algumas mulheres perguntavam:
«- De que serve à tribo uma fêmea côxa?»
Leila, a mãe, encolhia os ombros e respondia despreocupada:
«De alguma coisa há-de servir...
e também se diz que
A menina fazia-a feliz.
Quando nos escasso momentos de lucidez
que se seguiram ao parto
viu o seu próprio rosto
desenhado naquelas feições minúsculas,
sentiu uma alegriu desconhecida
que a surpreendeu
por entre os suores e a febre.

Por vezes, a literatura «menor»
dá-nos sugestões estupendas.
A mim diz-me que
quando se nasce há sempre esperança.

[9] O TRIUNFO DE UM CORAÇÃO


O último trabalho da islandesa Bjork chama-se MEDULLA, mas também se podia chamar beleza. Sem mais. Há vozes nuas, que ora ferem, ora consolam. Que vão à medula da existência, ao seu tutano. A busca do grito primigénio, do essencial humano. Leia-se (escute-se) repetidamente este hino há vitória da vida em The Triumph of a Heart.

The nerves are sending shimmering signals
All through my fingers
The veins support
Blood that gushes impulsively towards
Is the triumph of a heart that gives all
That gives all
The triumph of a heart that gives all
That gives all
The stubborn trunks of these legs of mine
Serve as pathways for my favourite fuel
Heading upwards towards my kidneys(that celebrate)
The triumph of a heart that gives all
Smooth soft red velvety lungs
Are pushing a network of oxygen joyfully
Through a nose, through a mouth
But all enjoys, which brings us to
The triumph of a heart that gives allThat gives all

[8] DEUS E O TOTOLOTO


Uma citação de que gosto para descrever a minha (nossa) auto-suficiência sisifiana. Vem de HANNS CORNELISSEN (filósofo e teólogo) e é uma carapuça que cabe na cabeça de muitos de nós.

É certo que na nossa época a questão de Deus passou de moda. A esperança de muitas pessoas já não se volta para a eternidade, mas antes para o pagamento atempado do seu seguro de vida. O mundo dos bens lançou as suas iscas, e as pessoas, como seres necessitados e dignos de abastecimento, orientam-se pelas promessas da sociedade de consumo, na qual vence aquele que morre com o maior número de brinquedos. Aqui, o mundo aparece como um labirinto e a vida como um escorrega para o nada. Talvez as pessoas passem de vez em quando rapidamente pelo supermercado esotérico e encham o seu cestinho de compras com os mantimentos para a partida, preferencialmente, com artigos de promoção irracionais.No entanto, também volta a crescer o número daqueles para os quais parece não ser concedida suficiente dignidade à vida se esta for compreendida como um subproduto de um gerador casual, em si absurdo e passageiro. Estes não impõem quaisquer limites de consumo ao seu pensamento, estando dispostos a levar o «factor Deus» pelo menos tão a sério como os números do totoloto sorteados aos sábados.

[7] - Reflexão poética sobre o Mysterion

Algures no meu hypomnemata encontrei este «salmo» de autor desconhecido irlandês do séc. XVI (em tradução de José D. Morais).


Quem é Deus
E onde está Deus?
De quem é Deus?
E onde a Sua morada?

Tem Ele filhos e filhas
O oiro e a prata
Este Deus de quem se fala?

Viverá Ele para sempre?
É grande a Sua beleza
E foi o Seu filho
Acolhido pelos homens?

São as Suas filhas
Queridas e amadas
Pelos homens do mundo?

Está Ele no céu
Ou será na terra?
No mar e nos rios
Na montanha e no vale?

Fala e diz-nos
Notícias Suas.
Onde O veremos
E como o Amar,
Como o achar?

É Ele um jovem
Ou de velha idade?
Onde O achar?
[JS]

[6] Viver no presente


Viver no presente é diferente de viver para o presente.

No primeiro caso, prestamos atenção ao sentimento complexo experimentado daquilo que é benéfico para nós. Procuramos seguir o fluxo da nossa consciência enquanto vamos sentindo, pensando, agindo e emocionando-nos, sempre com o fito de encontrar o que é benéfico para nós e para os outros.

No segundo caso, presta-se atenção ao mero impulso prevalecente em determinado momento: faz-se o que se sente como bom mas sem ter em conta eventuais consequências.

Entre os dois processos existe uma diferença absoluta: o segundo não possui o grau de fineza e subtileza do primeiro.


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