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[405] para começar bem a semana

«No tempo de Brejnev [...], havia uma jovem mulher russa numa universidade, especialista em literatura romântica inglesa. Essa jovem mulher foi metida numa cela sem luz, sem papel nem lápis, na sequência de uma delação idiota e completamente falsa, não é preciso dizê-lo. Sabia de cor o Don Juan de Byron (trinta mil versos ou mais). No escuro, põe-se a traduzi-lo mentalmente em rimas russas. Quando sai, depois de ter perdido a vista, dita a tradução a uma amiga: é hoje a maior tradução russa de Byron.
Perante isto, digo de mim para mim várias coisas, e, para começar, que o espírito humano é indestrutível, totalmente. Em segundo lugar, que a poesia pode salvar o homem. Até mesmo no impossível. Em terceiro lugar, que uma tradução, apesar da sua imperfeição humana, traduz aquilo que traduz, o que é uma outra maneira de dizer que a linguagem e a realidade mantêm uma relação que as liga. E, em quarto lugar, digo-me que devemos sentir uma grande alegria».

[G. Steiner & A. Spire (2004). Barbárie da ignorância. Lisboa. Fim de Século. Tradução: Miguel Serras Pereira]
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