[10] Quando se nasce há sempre esperança
EM AULYIA,
de Véronica Murguía (Ed. ASA)
diz-se que:
Aulyia não chorou quando nasceu [...].
A menina tinha um problema na perna.
Além disso, era muito pequena;
um cachorrinho silencioso que não chorava,
um rato do deserto.
Contavam as mulheres que cuidavam dela que,
quando se aproximavam da menina durante a noite,
esta seguia os seus movimentos com o olhar.
«É como se conseguisse ver no escuro»?,
sussurravam entre si.
Os velhos, o marido e algumas mulheres perguntavam:
«- De que serve à tribo uma fêmea côxa?»
Leila, a mãe, encolhia os ombros e respondia despreocupada:
«De alguma coisa há-de servir...
e também se diz que
A menina fazia-a feliz.
Quando nos escasso momentos de lucidez
que se seguiram ao parto
viu o seu próprio rosto
desenhado naquelas feições minúsculas,
sentiu uma alegriu desconhecida
que a surpreendeu
por entre os suores e a febre.
Por vezes, a literatura «menor»
dá-nos sugestões estupendas.
A mim diz-me que
quando se nasce há sempre esperança.